“Qualquer pessoa que se apaixone é uma aberração. É algo
louco de se fazer. Uma forma socialmente aceitável de insanidade”.
Eu temo o dia em que a tecnologia ultrapasse a interação
humana, foi o que disse um dos mais notáveis cientistas da história da
humanidade. De fato, em tempos em que a internet e a evolução de aparelhos
eletrônicos se tornam cada vez mais crescentes, parece ser muito mais prático e
coerente estabelecer relacionamentos virtuais no lugar de enraizar convivências
reais.
O cientista supracitado é Albert Einstein e o filme Ela é apenas mais uma evidência de que o
futuro profetizado pelo alemão está iminentemente próximo. Dirigido e
roteirizado pelo peculiar Spike Jonze
(de Quero Ser John Malkovich e Onde Vivem os Monstros), a película é o
reflexo incrível da dependência e carência que envolve o elo entre homem e
máquina.
Theodore Twombly (Joaquin
Phoenix) é um melancólico e solitário homem que está saindo de um recente
divórcio. Curiosamente, sua vida pessoal entra em um brutal contraste com a
profissional, uma vez que é por meio da escrita de cartas para outras pessoas
que ele encontra a sua catarse sentimental.
Talvez com receio de que sua rotina fosse completamente
subjugada pela depressão, Theodore compra um sistema operacional com
inteligência artificial, uma espécie de amigo virtual. No caso, uma amiga,
Samantha, na voz original de Scarlett
Johansson. Cumprindo sua função como qualquer computador, Samantha é a
companheira perfeita e passa a ser a nova conexão de Theodore com o mundo. A
questão que paira em quase toda a exibição é a seguinte: uma relação, mesmo que
virtual, pode ser duradoura e, quiçá, mais sólida do que uma real?
A resposta é óbvia e o próprio filme a mostra ao longo do
percurso, em especial nas cenas em que outras pessoas na rua conversam com seus
“amigos operacionais” e também na existência de bate-papos cuja única
finalidade é garantir um sexo simulado e gratuito. Ironicamente, o enredo se
agrava por se situar em locais como Los Angeles e Xangai, ambos com belíssimos
cenários, revelando que é praticamente um pecado dedicar a atenção a um
aparelho do que na paisagem ao redor.
O que faz de Ela
ainda mais preocupante é a cativante atuação de Joaquin Phoenix (que
injustamente não recebeu uma indicação ao Oscar), que passa boa parte da trama
sozinho e que consegue, por meio de sua performance facial, retratar a angústia
e languidez de um indivíduo que se sente abandonado. Scarlett Johansson, que
não aparece em momento algum, se destaca igualmente por trazer características
humanas a um programa de computador, como o desejo de ter questionamentos
respondidos e os suspiros entre as frases. Amy
Adams tem o papel de suporte social para o protagonista, mas também não
deixa a desejar.
Em Ela, Spike Jonze
mesclou romance dramático com ficção científica e conseguiu arrancar elogios da
crítica, recebendo inclusive o Oscar de Melhor Roteiro Original. Infelizmente,
estampou a face decadente da humanidade; milhares de pessoas idolatram filmes,
livros, artistas, e todo o afeto depositado em ferramentas como Facebook e
Whatssap são somente mais um produto do pacote. É o desespero em querer sempre
se relacionar com algo ou alguém, seja de origem real ou virtual, moldando
mentes superficiais. Esperto foi o Einstein, que saiu de cena antes de ver
concretizada sua infeliz profecia.
Trailer:
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