“Nossa vida não é nossa de fato. Do útero ao túmulo, temos ligações com os outros, no passado e presente. E por cada crime e cada bondade, geramos nosso futuro”.
A História é viva e, portanto, está em constante processo de desenvolvimento. O curioso e talvez, de certa forma, impressionante, é que ao fazer uma análise histórica de determinados fatos ocorridos na humanidade, é possível ver que há alguns personagens, de épocas e classes sociais distintas, que lutaram e acreditaram em ideais semelhantes.
Não sei se existe uma teoria histórica para isso, mas às vezes fica fácil de ver que toda a linha do tempo está interligada quando se observa os erros passados refletindo no presente e ecoando no futuro. Esse efeito dominó, que perpassa o interior das eras, é um dos temas centrais do filme A Viagem, baseado no romance de David Mitchell.
Após uma exibição de quase 3 horas, é realmente difícil não refletir a respeito da ideologia proposta. E as peculiaridades vão desde o enredo à direção, uma vez que foi um filme comandado pelos irmãos Wachowski (criadores de Matrix) e por Tom Tykwer (diretor de Corra, Lola, Corra). Ainda que seja um filme projetado por três visões, o resultado final causa uma forte e boa impressão na memória devido ao equilíbrio delicadamente explorado.
O roteiro, por si só, é digno de mérito. Procurando ser fiel à obra, o longa apresenta ao espectador seis núcleos, os quais se passam em anos totalmente diferentes. A proeza reside em fazer isso aleatoriamente sem prejudicar o entendimento, pois todas as histórias estão conectadas de alguma maneira. E por isso uma atenção redobrada é essencial. Começamos no século XIX, acompanhando a viagem de um advogado que almeja voltar para casa ao passo que inicia uma amizade com um escravo.
Em seguida, há o primeiro salto temporal: a edição nos leva para a década 1930, na qual conhecemos um jovem deserdado que sonha em se tornar um compositor. Sendo ajudante de um grande músico, o rapaz consegue compor o Sexteto Atlas das Nuvens (Cloud Atlas, título original do filme e da obra). Na década de 1970, vemos uma jornalista tentando desvendar um misterioso assassinato. 2012 é o núcleo da comédia, em que um grupo de idosos tenta escapar de um asilo. Em 2144, um clone transforma-se no ícone de uma resistência. E, por fim, somos apresentados ao que sobrou da civilização em um futuro pós-apocalíptico.
E se o roteiro e direção merecem suas congratulações, o mesmo vale para a equipe de maquiagem e efeitos visuais. Os atores, também ótimos, foram transfigurados e algumas vezes nem é possível identificá-los em meio a tantas transformações; alguns aparecem em todas as histórias e inclusive há casos de troca de sexo. Destaque especial para Tom Hanks, Halle Berry, Jim Sturgess, Donna Bae e Hugo Weaving.
Acima de tudo, A Viagem defende a liberdade, o amor e a verdade como um direito de todos, independente da hierarquia social. Para que essa ideia seja sustentada até o fim, o enredo se apoia em reflexões filosóficas, sociais e cristãs, elementos que criam uma atmosfera mais lúdica ao filme. Muitos personagens, de épocas diferenciadas, deixaram suas marcas na História, conectando vidas e emoções. E se houver uma teoria para isso, espero que resultados positivos ecoem nas gerações futuras. Pelo menos, não custa nada acreditar.
"Acredito que há outro mundo esperando por nós. Um mundo melhor. E eu estarei esperando por você lá".
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