sexta-feira, 29 de novembro de 2013

A Culpa é do Desconto



É curiosa a reação que um ávido leitor pode ter ao descobrir que uma livraria de sua cidade está oferecendo desconto de até 80% nas obras de seu estoque. Especialmente se este leitor, assim como eu, for... digamos... Um pouco econômico. 

Primeiro veio a surpresa. Em seguida, a incredulidade. A última etapa foi a da convicção, a qual se deu quando me deparei diante da livraria, que exibia na entrada o enorme cartaz com o anúncio do desconto. 

Embora eu ainda não conseguisse acreditar, já havia feito durante o percurso uma lista de pelo menos dez títulos que há tempos eu esperava para ler. E, se eu estivesse com sorte, poderia trazer comigo quiçá metade ou mais que isso; sendo período de final de ano, vai que de repente os benditos estivessem sob uma promoção natalina. Nunca se sabe... 

Sendo este que vos fala dotado de uma imaginação bastante fértil, minha mente ocupou-se com diversas possibilidades. Já conseguia me vislumbrar lendo um após o outro, com a satisfação de ter gastado pouco com eles, semelhante à sensação da criança que constrói um castelo de areia à beira da praia. Sim, pois se existir uma lista de excitação literária, certamente livros baratos é um dos itens mais chamativos. 

Enfim, a espera terminou. Entrei, acompanhado de minha humilde e incrível inocência, e procurei não perder tempo: fui logo para a prateleira dos Best-sellers. E assim veio o primeiro impacto; mais da metade dos livros que eu planejei comprar não constavam ali. Tudo bem. Isso é normal, pensei eu. 

Então sofri o segundo impacto. A livraria aceitava apenas pagamento em espécie. Lascou-se, disse comigo mesmo. Quem tinha o sonho de sair dali com uma pilha de obras parceladas em várias vezes no cartão de crédito, teve suas asinhas cortadas. 

Nada de tão grave, eu supus, uma vez que os descontos já iriam favorecer muito o ato da compra. Peguei dois dos livros que almejava adquirir e me direcionei até o balcão. Perguntei à funcionária quanto ambos teriam de abatimento. Ela me respondeu: 10%. 

Nunca fui bom com números, mas ainda assim imaginei que o valor seria bem reduzido. Foi quando veio o terceiro impacto. Engoli a seco, enquanto meu castelo de areia era destruído por um tsunami. Devolvi os títulos aos seus respectivos lugares e vaguei por entre as prateleiras de História e Serviço Social. Àquela altura, me restavam duas opções: eu poderia ir embora sem levar nada, ou ao menos poderia escolher uma obra para disfarçar a decepção. 

E então eu vi. Na parte mais alta de uma prateleira, um livro de capa azul olhava para mim. “A Culpa é das Estrelas”, do autor John Green, foi o que li. Nada mal, eu pensei. Uma obra aclamada pela crítica literária, e que inclusive era um dos títulos da minha lista, por que não ser a sorteada do dia? Voltei ao balcão e perguntei quanto ficaria com o desconto, na esperança de que o valor fosse razoável considerando a finura do livro. Como se isso fosse critério básico para estabelecer o preço de uma obra... 

E percebi que, se ainda restava alguma coisa do meu castelinho de areia, a terra tratou de tragar os resquícios dos escombros. 

Três reais de abatimento.

Cansado, desanimado, e com vontade de sair dali, não resisti e decidi comprá-lo. Na saída, me questionei se havia algum culpado nessa história. Eu, que permito que meu senso econômico deturpe a realidade? A livraria, que poderia ter sido mais gentil em seus descontos? Ou o próprio desconto, motivo que me levou até lá? 

Culpados à parte, um novo livro me aguardava, e depois voltei a pé para casa.

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Jogos Vorazes: Em Chamas


Ela precisa ser eliminada. Toda a sua espécie tem que ser erradicada”.

É natural que uma obra que se enquadra na classificação infanto-juvenil tenha contida em sua trama temas como aventura, heroísmo e amor. E, é claro, que vez ou outra possua elementos que se distanciam da realidade. Mas também é bastante deleitoso quando o enredo contém uma profundidade inesperada, a qual oferece à história variados caminhos que possibilitam o estímulo da interpretação. 

De fato, Jogos Vorazes não é um produto que tem somente como finalidade arrebatar corações apaixonados. A primeira versão cinematográfica do livro de Suzanne Collins foi muito clara com relação a isto; afinal, se há algo a ser exaltado merecidamente em Jogos Vorazes, com certeza é a relação social estabelecida entre as minorias e os mais favorecidos, assim como todas as ações reacionárias e liberais que isso resulta. 

Em Chamas, apesar de ser moldado sob a perspectiva de uma nova direção (Francis Lawrence, mesmo diretor de Constantine e Eu Sou a Lenda), preserva as nuances positivas do primeiro filme e ainda, como toda boa saga deve fazer, deixa vestígios de que a gravidade dos acontecimentos tenderá a piorar.


Depois de vencer o 74º Jogos Vorazes, Katness Everdeen (Jennifer Lawrence) não consegue ver muita diferença na situação de distopia a qual os doze Distritos são submetidos. Panem demonstra um autoritarismo maior e a prova disso se configura no Presidente Snow, que, convencido de que Katness tenha despertado um monstro que nunca deveria acordar, está disposto a evitar qualquer ato de rebeldia contra a Capital. 

O contexto se agrava no momento em que os receios do Presidente tornam-se convicção. O fato de Katness e Peeta terem escapado dos Jogos com vida deu à população dos Distritos o discernimento para compreender que as barreiras da opressão podem ser contestadas e, acima de tudo, quebradas. A “garota em chamas” transformou-se em um símbolo para o povo e sua eliminação é necessária. Com isso, a Capital decide fazer novos Jogos, agora apenas com os vencedores das edições passadas, forçando Katness e Peeta a encararem a arena mais uma vez. 


O elenco permanece ótimo e recebe acréscimos; além dos novos Tributos, tem-se a adição de Philip Seymour Hoffman, em uma atuação excepcional. Os efeitos especiais melhoraram, provando que o sucesso do longa anterior tinha que reverberar de alguma maneira. No entanto, o tema sádico não é tão presente aqui. Dessa forma, os Jogos ficam de lado para dar mais espaço às subtramas, como abuso de poder e manipulação. O sangue foi substituído pela ideologia, algo que talvez fique mais explícito no terceiro filme. 

Jogos Vorazes: Em Chamas, então, serve de ponte para potencializar o que foi apresentado antes e estimular as labaredas da revolução que se aproxima (O final é aberto, no estilo Matrix Reloaded, o que certamente não agradará uma parcela dos espectadores). E se os produtores continuarem investindo neste aspecto é possível que o cinema fique diante de uma franquia que marque uma geração de jovens; não pelo amor, heroísmo ou aventura contidas na obra, e sim pela esperança de tornar seu público seres mais críticos e pensantes. 

Lembre-se de quem é o verdadeiro inimigo”.


Trailer:
 

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Thor - O Mundo Sombrio



Muitos acreditam que antes do Universo, nada havia. Estão errados. Havia trevas. E elas sobreviveram”. 

Após o tremendo sucesso arrecadado com Os Vingadores, a Marvel logo se empenhou para agilizar os preparativos da fase 2 nos cinemas, tendo início com a estreia de Homem de Ferro 3. No entanto, a terceira aventura solo de Tony Stark não agradou muitos fãs e tampouco deixou pistas de outros personagens do universo Marvel, algo que era sempre perceptível e interessante de analisar nos filmes anteriores. 

Dando continuidade ao projeto, cujo objetivo é chegar aos Vingadores 2, agora é a vez do asgardiano Thor voltar em seu segundo capítulo, surpreendentemente entregando ao público um filme não apenas melhor que o primeiro, mas também digno de preparar o terreno para os futuros planos da fase 2. 

O Mundo Sombrio começa apresentando o novo vilão, Malekith, rei dos Elfos Negros, e seu sórdido plano de encobrir todo o cosmo de escuridão. Depois de ser derrotado por Bor, pai de Odin (Anthony Hopkins), Malekith se exila e aguarda o momento de sua vingança. No presente, Thor (Chris Hemsworth) tenta pacificar os Nove Reinos enquanto Loki (Tom Hiddleston), depois de toda destruição que causou na Terra em Os Vingadores, é preso nos calabouços de Asgard.



No plano terrestre, Jane (Natalie Portman) ainda tenta compreender os fenômenos físicos e astrológicos que fizeram Thor cruzar seu caminho. Devido ao fato de estar no lugar errado e na hora menos conveniente, ela se torna uma peça fundamental do ardiloso esquema de Malekith, motivo que faz o Deus do Trovão levá-la para Asgard no intuito de que fique protegida. Entretanto, desta vez a ameaça pode atingir todos os Nove Reinos, e Thor é compelido a pedir a ajuda de Loki para que o equilíbrio cósmico não seja maculado. 

Agora com direção de Alan Taylor, aqui o cenário asgardiano ganhou novas feições; está mais bonito e grandioso, um trunfo que o filme soube usar muito bem, uma vez que grande parte do enredo se passa lá. Além disso, o espectador tem a oportunidade de ver as táticas de proteção da cidadela em uma batalha estruturalmente formidável e com belos efeitos visuais.


Contudo, certas falhas não passam despercebidas. Se Homem de Ferro 3 se apoiou nas cenas de ação e se despreocupou com a história e, principalmente, com a fidelidade aos quadrinhos, Thor – O Mundo Sombrio peca na comédia exacerbada. Afinal, com este subtítulo, era de se imaginar algo mais dramático. É comum que um filme de herói possua alívios cômicos, mas ao ponto de ofuscar a batalha final e fazer o protagonista deixar de lado as dores pessoais? 

Em suma, apesar de ser superior ao longa que deu início à fase 2, Mundo Sombrio também comete erros semelhantes; o vilão, por exemplo, possui uma motivação que não convence. Pelo menos, Loki conquistou mais momentos de glória e o final deixou ganchos para Guardiões da Galáxia, Vingadores 2 e um provável terceiro filme da franquia do Deus do Trovão. Novamente, a Marvel plantou rastros das grandes coisas que estão por vir e mostrou que sua capacidade de entreter ainda está bem longe de terminar.


Trailer:

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

É Preciso Saber Viver


Um famoso personagem da literatura infanto-juvenil certa vez disse: "Não vale a pena viver sonhando... E se esquecer de viver".

Esta assertiva combina um pouco com a música selecionada para hoje, É Preciso Saber Viver, na versão dos Titãs. A canção, que é quase um guia que descreve o que muitos encontrarão em seus caminhos e em suas vivências, exalta o fato de viver com sabedoria e tomar cuidado com ilusões e sofrimentos.

Porque aprender a viver é algo que se renova todos os dias, e as lições da vida só acabam quando damos o último suspiro. Portanto, aprendamos a viver com sabedoria para que as pedras e os espinhos do caminho não sirvam como percalços, e sim como experiências de amadurecimento. 


Letra:

É Preciso Saber Viver

Quem espera que a vida
Seja feita de ilusão
Pode até ficar maluco
Ou morrer na solidão
É preciso ter cuidado
Pra mais tarde não sofrer
É preciso saber viver

Toda pedra do caminho
Você pode retirar
Numa flor que tem espinhos
Você pode se arranhar
Se o bem e o mal existem
Você pode escolher
É preciso saber viver

É preciso saber viver
É preciso saber viver
É preciso saber viver
Saber viver, saber viver!

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Kick-Ass 2


Kick-Ass não é apenas uma fantasia. É quem realmente você é”.

Em 2010, quando a versão cinematográfica do quadrinho Kick-Ass tornou-se realidade, não demorou muito para que chamasse a atenção. Não pela parte estrutural e técnica do filme, mas, sobretudo, por conter elementos insanos e completamente inesperados. Afinal, era hilário ver um adolescente nerd vestindo-se com roupa de mergulho no intuito de se tornar um super-herói, na mesma proporção em que era estarrecedor ver uma garotinha especialista em armas decepando membros de mafiosos. 

Pouco tempo depois, não foi surpresa anunciarem a continuação da obra de Mark Millar. A expectativa aumentou com a contratação do novo diretor, Jeff Wadlow, o qual escreveu um roteiro baseado fielmente no quadrinho. Dessa forma, Kick-Ass 2 chega, assim como seu predecessor, trazendo o mesmo clima que o enriqueceu e também exibindo novas características que enaltecem ainda mais a história desenvolvida por Millar. 

Após os acontecimentos do primeiro longa, as loucas atitudes de Dave (Aaron Taylor-Johnson) ao criar o herói Kick-Ass inspiraram outras pessoas a fazerem o mesmo. Agora existem mais super-heróis espalhados pela cidade, cada qual com um nome mais criativo que o outro. Na medida em que Dave tenta se acostumar com a companhia dos novos colegas e entra para a liga de heróis Justiça Para Sempre, comandada pelo Coronel Estrelas (Jim Carrey), Mindy (Chloe Grace Moretz) se esforça ao máximo para ter uma vida normal e esquecer que um dia já foi a Hit Girl. 


Com novos heróis, também se tem novos vilões. Depois da trágica morte de seu pai na aventura anterior, Chris D’Amico (Christopher Mintz-Plasse) é alimentado pelo desejo de vingança; ele não irá descansar até que Kick-Ass pague pelo mal que causou à sua família. Ele assume a carapuça vilanesca do Mother Fucker e o arco da sua jornada sombria é uma das coisas mais interessantes de se ver na película. 

Apesar da mudança na direção, a atmosfera continua idêntica. A estética que lembra uma história em quadrinho, assim como as referências à cultura pop, permanecem intactas no cerne da obra. A trilha sonora envolvente e empolgante lembra muito clássicos de videogames dos anos 80 e 90 e é tocante nos momentos que precisa ser. O senso heroico está mais intenso e rende boas cenas. No entanto, para quem gostou do humor do primeiro filme, é necessário dizer que o assunto aqui é levado a outro nível. Sim, desta vez Kick-Ass está mais dramático e psicológico, elementos que somente fortaleceram a narrativa. 


Infelizmente, nem tudo é perfeito em Kick-Ass 2. Por ser um filme curto (com menos duração que o primeiro, pelo menos), certos eventos acontecem rápido e alguns personagens poderiam ter sido mais aproveitados, como o Coronel Estrelas e outros heróis e vilões novos. Ao final, fica a vontade de ver mais do potencial que a produção tem a oferecer. Todavia, o foco de fato é de domínio do trio do longa passado, aqui com seus respectivos caminhos bem definidos. 

Kick-Ass 2 trouxe surpresas, ainda preservando elementos do seu antecessor. A violência, o sangue e o humor continuam lá e Hit Girl mais uma vez brilhou com êxito. E também traz consigo um drama e seriedade que não desmerecem a obra, apenas revelam mais uma faceta interessante desse universo. Em sua segunda versão cinematográfica, Kick-Ass novamente chamou atenção e conseguiu mostrar que para ser um super-herói não é preciso ter poderes; basta coragem e força de vontade para levar luz à escuridão.


"O mundo real precisa de heróis reais".

Trailer: