sábado, 27 de abril de 2013

É como nas grandes histórias



Monteiro Lobato certa vez disse que uma nação é feita por homens e livros. Embora seja verdade que nos tempos antigos a literatura era parcialmente inacessível – tendo como público alvo a burguesia intelectual – hoje se pode ver uma realidade diferente, mesmo que permaneça nem um pouco adequada. 

Nesta semana tivemos o Dia Internacional do Livro, e eu não iria me surpreender ao saber que poucas foram as pessoas a lembrar disto. Infelizmente, ainda que o número de jovens leitores esteja crescendo e isso movimente as engrenagens da evolução do letramento, muitos continuam não enxergando o valor de um livro. 

23 de abril foi marcado para ser o Dia Internacional do Livro por esta ser a data de falecimento de Miguel de Cervantes, autor do cânone Dom Quixote. E uma vez que os clássicos sejam obras que permeiam gerações e se perpetuam por décadas, o Menino das Letras deixa sua homenagem por meio do fragmento de uma obra contrariada e, ao mesmo tempo, aclamada por muitos: O Senhor dos Anéis, de J.R.R. Tolkien. 

"É como nas grandes histórias, sr. Frodo. As que tinham mesmo importância. Eram repletas de escuridão e perigo. E, às vezes, a gente nem queria saber o fim. Por que como poderiam ter um final feliz? Como o mundo poderia voltar a ser o que era, depois de tanto mal? 

Mas, no fim, é só uma coisa passageira... Essa sombra. Até a escuridão tem que passar. Um novo dia virá. E, quando o sol brilhar, brilhará ainda mais forte. Eram essas as histórias que ficavam na lembrança, que significavam algo. Mesmo que você fosse pequeno demais para entender por quê. Mas acho, sr. Frodo, que entendo, sim. Agora eu sei. 

As pessoas dessas histórias tinham várias oportunidades de voltar atrás. Mas não voltavam. Elas seguiam em frente... porque tinham no que se agarrar. 

- E em que nós nos agarramos, Sam? - pergunta Frodo. 

 - No bem que existe neste mundo. Pelo qual vale a pena lutar".

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Zumbilândia


Ó, América! Eu gostaria de poder dizer que esta ainda é a América. Mas eu acabei percebendo que não se pode ter um país sem pessoas. E não tem pessoas aqui. Não, meus amigos. Estamos agora nos Estados Unidos da Zumbilândia”. 

O tema pós-apocalipse é uma fantasia que parece alimentar a imaginação das pessoas, como se o Apocalipse em si já não fosse assustador o suficiente. É possível perceber isso em diversos filmes e seriados, e o mais aclamado da atualidade é o premiado The Walking Dead, cujo conteúdo conquistou multidões de fanáticos por zumbis cobertos de sangue. 

Talvez seja, na menor das hipóteses, curioso saber como a humanidade lutaria para se manter viva em um mundo onde tudo está contra ela. Além de ser algo profundamente dramático, nos faz refletir a respeito da condição humana perante si mesma. Agora imagine ver este tema com este teor, acrescentando os zumbis, sendo narrado de maneira cômica e inocente, oscilando entre o humor sádico e inteligente.

 

Esses são os elementos que compõe Zumbilândia, uma comédia-zumbi que foi o filme de estreia do diretor Ruben Fleisher. A narração do enredo é desenvolvida por Columbus (Jesse Eisenberg), um jovem paranoico que sobrevive no mundo dos mortos-vivos seguindo uma tabela de regras criada por ele. Certo dia, ele cruza o caminho de Tallahassee (Woody Harrelson), um andarilho que preenche parte do seu tempo realizando seu hábito preferido: matar as criaturas sanguinárias da maneira mais brutal que puder.

Em um ambiente no qual eles julgavam que a melhor companhia era a solidão, eles acabam encontrando Little Rock (Abigail Breslin) e Whichita (Emma Stone) e descobrem como pode ser prazeroso estar perto de alguém. Cada um deles está indo para um lugar diferente, mas enquanto estão juntos fazem questão de aproveitar as pequenas coisas da vida, como na cena em que quebram uma loja inteira. 


Ruben Fleisher não fez feio em seu primeiro trabalho cinematográfico. Mesmo tratando-se de uma comédia, o diretor respeitou o tema zumbi e não hesitou em fazer o sangue jorrar pela tela. Os atores também fizeram um ótimo trabalho e um dos pontos altos do longa é o modo como os personagens matam as criaturas do mal. Isso sem contar a participação especial de Bill Murray, que é formidável. 

Sequências em câmera lenta são algo bastante presente no decorrer da exibição, porém utilizadas na medida correta e em momentos de impacto (destaque para o clímax que acontece no parque de diversão). Ao final, o quarteto acaba passando pelas mesmas reflexões que os heróis de qualquer história apocalíptica, em que não ficar sozinho é o caminho para poder apreciar as coisas boas que a vida ainda tem a oferecer no meio de tanta adversidade. E, certamente, matar zumbis não é uma delas. 

Aquela cara era eu percebendo que aquelas garotas espertas, aquele grande carro preto, e aquele cara com jaqueta de pele de cobra, eram o que eu tinha de mais próximo ao que sempre quis, mas nunca tive realmente. Uma família. Eu confiava neles e eles, em mim. Regra número 32: aprecie as pequenas coisas”.

Trailer:


sexta-feira, 5 de abril de 2013

Ruby Sparks: A Namorada Perfeita

 

Esta é a verdadeira e impossível história do meu grande amor. Esperando que ela não leia e me censure, eu omiti vários detalhes. Seu nome, dados sobre onde nasceu e cresceu, e as cicatrizes ou marcas que poderiam identificá-la. De qualquer modo, não posso evitar de escrever isto para ela”. 

É triste afirmar isso, mas até hoje não tenho um conceito limpo e claro do que a escrita representa para mim. Escrever é uma atividade tão complexa e inesperada, que talvez não existam palavras certas para conceituá-la como uma receita que todos leem e seguem os passos. Porém, uma coisa eu posso confirmar: sentir o poder das letras construindo ideias e levantando os muros da imaginação frequentemente pode ser visto como mágica. 

Em Ruby Sparks: A Namorada Perfeita, acompanhamos o cotidiano de um rapaz que vive em uma fortaleza alicerçada por suas palavras. Calvin (Paul Dano) é um jovem escritor, que no passado consagrou sua carreira com seu livro de estreia ao ponto de torná-lo um clássico da literatura moderna. O problema é que após anos vivendo sob a fama do primeiro livro, os leitores e amigos passam a cobrar um novo trabalho.

 

Sendo um solitário, que não convive com outras pessoas a não ser seu irmão e seu terapeuta, Calvin não faz ideia do que pode escrever. Contudo, inspirado por um sonho com uma garota ruiva, ele passa a redigir um romance a respeito de Ruby, sua protagonista imaginária, a namorada que qualquer homem gostaria de ter, principalmente ele. 

Neste ponto, o filme lembra muito Mais Estranho Que a Ficção, pois Ruby Sparks (Zoe Kazan), a personagem, começa a aparecer para Calvin como uma pessoa real. O que seria loucura, se não fosse o fato de que outras pessoas também conseguem vê-la e a tratá-la normalmente. Logo Calvin percebe que pode usufruir bastante de sua criação, incluindo na influência de ser capaz de manipular seus atos e emoções. Entretanto, não é possível fazer isso sem sofrer consequências.


Dirigido por Jonathan Dayton e Valerie Faris (a dupla de Pequena Miss Sunshine), e escrito pela atriz que interpreta Ruby, a película trata de um tema já visto, mas com a dádiva de não cair na previsibilidade. O elenco conseguiu estabelecer uma sintonia harmoniosa e a cena com os antagonistas são as melhores (Destaque para o irmão). E a trilha sonora, a qual sabiamente não usou de artifícios grandiosos, encanta o espectador ao som dos lânguidos violinos. 

Ruby Sparks: A Namorada Perfeita é um filme que aborda a escrita como um resgate contra a solidão. Vemos um protagonista soterrado pela angustia encontrando conforto na magia da escrita e, sobretudo, percebendo que as palavras, ainda que sejam capazes de criar mundos, também podem ter um papel fundamental em nossas vidas. E mesmo que muitos não consigam conceituar o ato de escrever, não há com o que se preocupar; afinal, milagres simplesmente acontecem. 

Alguém poderia ler este livro e achar que é mágica, mas se apaixonar é um ato de magia. E escrever também é. Todo escritor pode testemunhar, no estado mais afortunado e feliz, que as palavras não proveem de você, mas que passam através de você”.

Trailer: