“A morte cria um sentido pra nossa vida. Mais importante que isso: a morte cria um valor especial para o tempo. Se nosso tempo nessa terra fosse indeterminado, a própria vida perderia o sentido? Muito provavelmente ainda estaríamos com a bunda de fora e com uma lança nas mãos. A morte é o agente mais poderoso da natureza; ela vem para levar o velho e abrir espaço para o novo. Nosso esforço para evitá-la e fazer nossa curta estada aqui algo minimamente memorável, é o que nos motiva. Ou seja, só existe a vida porque existe a morte”.
Uma experiência, quando inovadora, não oferece a garantia de que trará bons frutos. É uma questão de empatia do público para com o objeto. E, no caso do cinema, também depende do tempo no qual o espectador está situado. Em um país onde é possível contar nos dedos os filmes que abordam ação e efeitos especiais, simultaneamente, realizar experiências que contribuam para o avanço da produção nacional é algo sempre bem-vindo.
Em 2 Coelhos, primeiro longa dirigido por Afonso Poyart, vemos não apenas uma mistura de gêneros distribuída de maneira coerente, como também há o acréscimo de animações (entre elas, uma ode aos jogos de videogame), referências da cultura pop/nerd e a aderência de uma trilha sonora internacional, passando por Radiohead e 30 Seconds To Mars. Essa junção de elementos audiovisuais abre as portas de uma nova perspectiva para o cinema brasileiro e talvez seja a promessa de um futuro promissor.
Edgar (Fernando Alves Pinto) é um cara sem planos para o futuro, aparentemente vive em um mundo isolado e que, após se meter em um evento traumático o bastante para modificar vidas, passa uma temporada de dois anos em Miami e regressa ao Brasil com um plano de vingança, no qual pode matar dois coelhos com um único golpe.
O plano é apresentado de forma aleatória e não linear, assim como a introdução dos personagens, entregando ao espectador a oportunidade de reunir todas as peças por conta própria. O que seria possível, se não fosse o clima tenso e misterioso instaurado a todo instante. Logo percebemos quem são os vilões e qual a intenção de Edgar em fazer justiça com as próprias mãos contra um sistema corrupto que o salvou no passado.
O elenco também é composto por Alessandra Negrini e Caco Ciocler, cada qual com seus segredos e respectivas finalidades, mais uma dádiva do roteiro. Com ótimas atuações e uma câmera lenta que foca a ação e a expressão dos atores, 2 Coelhos torna-se mais atrativo no decorrer da exibição e, em alguns momentos, há quem pense que não se trata de uma produção nacional.
Afonso Poyart, veterano na área das animações, nos entrega um filme de estilo inusitado, o qual, se houver investimento, pode criar ou até mesmo incentivar o desenvolvimento de um novo tipo de espectador no Brasil. É claro que, em algumas cenas, não há novidade; tiroteio, favela e suborno. O próprio Edgar, o “herói torto”, não escapa do lado ganancioso que perpassa nossa nação.
Mas a mensagem é outra e a poesia de 2 Coelhos pode ser encontrada na coragem (a cena de Alessandra Negrini com a espada samurai, retalhando seus demônios, é sublime). Poyart mostrou que uma direção visionária e novata, aliada a uma produção empenhada com um toque de sonho, consegue chegar a um resultado melhor do que se pensa. Enfim, uma experiência que deu certo.
Trailer:
Perfeita descrição
ResponderExcluirA citação sobre a morte é de qual obra (autor, livro, editora, etc.)?
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